sábado, 1 de maio de 2010

Raiva!

Há dias em que, toda a gente o sabe, mais valia ter logo começado por não tirar os cornos da almofada. Dias em que as coisas correm mal, em que o mundo não nos grama, em que só falta mesmo vir um cão e mijar-nos para a perna. Ou então as coisas não são assim tão más como parecem, e somos nós que reagimos epidermicamente a elas, e levamos a mal a mais pequena coisa. Passei hoje um dia desses, e assalta-me a fundada suspeita de que o fenómeno se prolongará por todo o fim-de-semana. Em resumo, sinto-me enraivecido.

A raiva é uma coisa bem diferente da depressão, do aborrecimento, da tristeza ou do descontentamento. Nada disso, a raiva é um vulcão primevo que nos ferve as entranhas, nos cerra os punhos e endurece as mandíbulas, que faz encordoar tendões e pulsar veias que de uso se mantêm discretamente ocultas. É uma vontade de espancar e partir e destruir e escavacar, de negar toda a racionalidade com uma caçadeira em punho, de fundamentar argumentos com uma cadeira pelos cornos abaixo de quem deles discorde.

Não se trata sequer de algo útil ou aceitável, pois não é uma raiva dirigida contra um objectivo quiçá merecedor de tais ataques. Não quer isto dizer que a raiva se não dirija a alvos, mas são alvos escolhidos apenas por capricho, por escolha subjectiva e pessoal, pelo puro enfartamento de sofrer sempre os mesmos jorros fecais sobre uma existência de si própria merdosa. E quando não há já reacção que nos valha, recorremos à raiva como última escolha, ou pelo menos penúltima. Ou então não recorremos, mas algo dentro de nós o acaba por fazer.

Hoje estou enraivecido. Os prognósticos, como se diz em meteorologia, apontam para uma continuação das mesmas condições nos próximos dias. Haverá decerto estragos, que coisas destas nunca passam sem deixar a sua marca, mas não consta que a Prevenção Civil tenha sido posta em alerta. E com boas razões, que nada que aconteça comigo passará de uma mera tempestade local. Mas não reputaria aconselhável estar nesse local, este fim-de-semana.

Só não me digam que estou errado, que não tenho razão. Isto é apenas uma pequena entrada intimista, que descreve um estado de espírito. E eu não tenho qualquer razão. Tenho apenas raiva!